quinta-feira, 5 de abril de 2018

Janela da Frente - Eleições Viciadas - Paulo de Morais




Eleições Viciadas

A Lei Eleitoral para a Assembleia da República é inconstitucional. A sua aplicação em concreto leva a situações aberrantes: há deputados que são eleitos com um quarto dos votos de outros. E há centenas de milhares de votos que nem têm expressão parlamentar; os que resultam da soma dos votos que não elegem, em cada círculo, qualquer deputado. Os resultados estão viciados, logo à partida.

Esta situação resulta dum processo eleitoral ultrapassado pela realidade, mas que os parlamentares não querem alterar, apenas para manterem os seus privilégios. Se fosse respeitada a Constituição, a geografia parlamentar seria bem diferente. Partidos como o Livre, o PDR ou o MPT teriam assento parlamentar. O PSD, o CDS e PS teriam menos deputados.

Rezam os artigos 149.º e 288.º da Lei fundamental que os partidos devem ter uma proporção de deputados equivalente ao número de votos. Mas tal não  acontece, nem de perto, nem de longe. Os deputados da Coligação PSD/PP foram eleitos com apenas vinte mil votos cada; mas já o Bloco de Esquerda precisou de trinta mil. E o único deputado do PAN necessitou mesmo de setenta e cinco mil votos para a sua eleição, quase quatro vezes mais do que os deputados social-democratas. Há mesmo partidos que, apesar de terem muitos mais votos do que os vinte mil que elegeram os deputados da coligação ganhadora, não estão representados no Parlamento.

A ser garantida a proporcionalidade do sistema eleitoral, que poderia ser conseguida com a criação de um círculo nacional de compensação, o PDR e o MRPP deveriam ter uma representação de dois deputados; e até o Livre, ou o MPT deveriam ter assento parlamentar. Mas ficam de fora. Inconstitucionalmente. Os lugares a que tinham legitimamente direito serão ocupados por deputados sem representatividade, mas que pertencem aos partidos que dominam o sistema — PSD, CDS, PS.

Curiosamente, Bloco de Esquerda e Partido Comunista, apesar de prejudicados, não reclamam. Talvez porque preferem assumir o prejuízo, com a garantia de que outros pequenos partidos, como o Livre, não lhes vêm disputar o protagonismo parlamentar.

É assim o mercado eleitoral português: os maiores partidos apropriam-se da expressão eleitoral dos mais pequenos, num inadmissível abuso de posição dominante. E os pequenos, em vez de se defenderem, mantêm os ainda mais pequenos no ostracismo, apesar de estes representarem centenas de milhares de eleitores.

Gorada que parece estar a possibilidade de o Parlamento afinar, como deveria, a Lei Eleitoral, garantindo a sua constitucionalidade – resta aguardar que o Presidente da República suscite a questão da constitucionalidade; ou, em alternativa, que o faça a Provedora de Justiça, que já foi para tal devidamente alertada pela Direcção da Frente Cívica.