terça-feira, 25 de abril de 2017

Janela da Frente - CUMPRIU-SE ABRIL? - Maria Teresa Serrenho



Cumpriu-se Abril?

Hoje mais uma vez descemos a Avenida da Liberdade, nas comemorações do 25 de Abril.
Muita gente, muita serenidade nos cidadãos comuns, muita curiosidade dos muitos turistas, (que também de cravo na mão) tiravam fotografias a tudo e a todos.
Há sempre as vozes criticas, que vão criticando os que continuam a comemorar Abril de cravo ao peito. Mas não é, não pode ser, nenhuma vergonha comemorar a “Revolução dos Cravos”!...
Não podemos ter vergonha de ostentar um cravo ao peito e muito menos de contar aos mais novos como foi a revolução.
Só podemos ter orgulho, porque conseguimos pôr fim a cinquenta anos de ditadura, com uma revolução em que as espingardas em vez de tiros tiveram flores!...
E a revolução só teve sucesso porque o povo anónimo, cedo se juntou aos soldados, encheu as ruas e no fundo condicionou qualquer tentação mais bélica que poderia ter acontecido entre militares.
Os Portugueses são considerados gente de brandos costumes, muitas vezes depreciativamente, mas, isso significa, que também somos gente de Paz. E, se significar que somos tolerantes com as diferenças dos outros, não será com certeza um defeito, mas sim uma virtude!...
Aquele espírito da revolução dos cravos, (que vivi intensamente, com todo o entusiasmo, decorrente da própria revolução e potenciado pelos meus dezoito anos), já não existe.
Aqueles momentos de sonho, de esperança e de espírito de solidariedade e de fraternidade, que trouxe à rua no primeiro dia 1 de Maio (livre) milhares e milhares de pessoas, numa alegria e num espírito de união, sem partidos, sem sectarismo, nem interesses, mostrando que afinal os portugueses também se conseguem mobilizar e que já o provaram muitas vezes.
Passaram 43 anos, será que “Abril se cumpriu”?
Muita coisa falhou. Mas, foi a própria revolução a culpada dessa eventual falha? Ou fomos nós, os Portugueses?
Quem permitiu que se apropriassem do poder, os mesmos do costume, desvirtuando os ideais de humanismo, de solidariedade e de participação cívica activa?
Quem permitiu este clientelismo e conformismo que deixámos instalar?
Quem promoveu a indiferença e a falta de participação cívica?
Em última análise, a responsabilidade é de TODOS!   
No entanto há que olhar para trás, com um olhar isento e justo e compararmos. Vemos com certeza hoje um país bem diferente do Portugal de 1974.
Muitos esqueceram como era a vida dos cidadãos mais humildes, ou melhor, a vida da maioria dos cidadãos. Esqueceram como eram as suas terras sem água e sem luz, como eram as acessibilidades, as escolas, a saúde…
E muitos esqueceram o que era a falta de liberdade, de liberdade de reunião e de expressão, a insegurança, a perseguição política, a censura, a repressão…
Portugal claro que mudou, mudou muito, mas a esperança, o sonho não foi concretizado, Portugal poderia ser hoje um país fantástico, onde imperasse a justiça social, onde fosse efectivamente cumprida a Constituição, cujos alicerces se basearam nos ideais de Abril.
Os erros cometidos, os caminhos errados não se podem apagar, mas é urgente que se crie uma consciência cívica forte, para que se exija que a justiça funcione, que haja transparência na vida pública, que se acabe com a corrupção e o compadrio, para que TODOS tenham realmente direito a uma vida digna, onde haja justiça e equidade, para que finalmente se “cumpra Abril”.


Maria Teresa Serrenho