terça-feira, 5 de julho de 2022

Frente Cívica pede explicações sobre atraso na publicação dos registos de interesses dos deputados

Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República

A associação Frente Cívica escreveu esta terça-feira, 5 de Julho de 2022, ao presidente do Parlamento, Augusto Santos Silva, alertando para a demora na publicação dos registos de interesses dos deputados, que continuam a não estar disponíveis no site da Assembleia da República, mesmo já depois de passados todos os prazos legais para a entrega dessa informação por parte dos deputados e membros do Governo.

"Não é na nossa perspectiva aceitável esta situação de incumprimento, que limita objetivamente a capacidade de a sociedade civil escrutinar a actuação do Parlamento e dos seus Deputados, em debates cruciais como o do Orçamento do Estado que acaba de ocorrer, e na qual se tornou impossível avaliar as intervenções dos Deputados à luz dos interesses que tenham registado", lê-se na carta assinada pelo presidente da Frente Cívica, Paulo de Morais. "A não divulgação do registo de interesses dos Deputados, em violação da Lei, permite suspeitar que haja alguma informação que o Parlamento pretenda esconder dos cidadãos, no âmbito das Declarações entregues ou – o que seria muito pior – que estas estejam a ser alvo de alguma cosmética, tendo em vista camuflar informação relevante e que assim seria ocultada aos cidadãos".

Abaixo, o texto completo da carta.


Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República,
Prof. Doutor Augusto Santos Silva 

  

Assunto: Divulgação do Registo de Interesses de Deputados

Data: 5 de Julho de 2022

 

Excelência,

Os cidadãos portugueses não têm ainda acesso aos registos de interesses dos Senhores Deputados, apesar de já terem passado mais de noventa dias sobre a data da posse do Parlamento, em 29 de março de 2022. Afigura-se-nos esta situação inadmissível, porquanto atenta contra o princípio constitucional de liberdade de informação e contraria as exigências de transparência impostas aos titulares de cargos políticos. Esta sonegação de informação é, ademais, ilegal.

Com efeito, nos termos do Artigo 26.º da Lei 60/2019, de 13 de Agosto, “Os Deputados estão obrigados à entrega da declaração única de rendimentos, património e interesses, nos termos previstos no regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos”. Essa entrega deve ocorrer “no prazo de 60 dias contados a partir da data de início do exercício das respetivas funções”, como estipulado pelo Artigo 13.º da Lei 52/2019, de 31 de Julho. Pelo que a informação relativa ao registo de interesses deveria ter sido disponibilizada aos cidadãos a partir da data de 28 de Maio de 2022.

E, mesmo na eventualidade de algum Deputado não ter então efectuado a referida entrega, o Artigo 18.º da já citada Lei 52/2019, determina que “Em caso de não apresentação ou apresentação incompleta ou incorrecta da declaração e suas atualizações (…) a entidade responsável pela análise e fiscalização das declarações apresentadas notifica o titular ou antigo titular do cargo a que respeita para a apresentar, completar ou corrigir no prazo de 30 dias consecutivos ao termo do prazo de entrega da declaração”.

Por outro lado, nos termos do Artigo 26.º da Lei 60/2019, “A Assembleia da República assegura obrigatoriamente a publicidade no respectivo sítio da Internet dos elementos da declaração única relativos ao registo de interesses dos Deputados”. E, para poder cumprir esta determinação de forma adequada e em prazo aceitável, “A Comissão Parlamentar de Transparência e Estatuto dos Deputados tem acesso electrónico em tempo real à totalidade das declarações de rendimentos, património e interesses apresentadas pelos Deputados à Assembleia da República e pelos membros do Governo, para efeitos de cumprimento das suas atribuições e competências.”

Resulta inevitavelmente do exposto que a Comissão Parlamentar de Transparência e Estatuto dos Deputados, dispondo dos meios técnicos e legais, deveria ter disponibilizado, no sítio da Internet, a informação relativa ao registo de interesses dos Deputados a partir, no máximo, do 61.º dia a partir da data de início do exercício das respetivas funções, para os Deputados cumpridores; e, no máximo, a partir do 91.º dia, relativamente aos Deputados que eventualmente não tenham apresentado a sua declaração ou o tenham feito de forma incompleta ou incorrecta.

Não é na nossa perspectiva aceitável esta situação de incumprimento, que limita objetivamente a capacidade de a sociedade civil escrutinar a actuação do Parlamento e dos seus Deputados, em debates cruciais como o do Orçamento do Estado que acaba de ocorrer, e na qual se tornou impossível avaliar as intervenções dos Deputados à luz dos interesses que tenham registado. A não divulgação do registo de interesses dos Deputados, em violação da Lei, permite suspeitar que haja alguma informação que o Parlamento pretenda esconder dos cidadãos, no âmbito das Declarações entregues ou – o que seria muito pior – que estas estejam a ser alvo de alguma cosmética, tendo em vista camuflar informação relevante e que assim seria ocultada aos cidadãos.

Vimos, pois, solicitar a Vossa Excelência que determine a recolha, por parte da Comissão Parlamentar de Transparência e Estatuto dos Deputados, da informação relativa ao registo de interesses de todos os Deputados. E, de seguida, proceda à sua divulgação imediata no sítio da Internet da Assembleia da República, sem prejuízo de futuras actualizações que se venham revelar necessárias ou úteis no âmbito do trabalho de verificação das ditas declarações, actualmente em curso em sede da Comissão Parlamentar de Transparência e Estatuto dos Deputados.

Com os melhores cumprimentos,


Paulo de Morais,

Presidente da Frente Cívica