quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

Frente Cívica apoia iniciativa legislativa pela protecção do cidadão denunciante


A Frente Cívica é uma das 20 organizações da sociedade civil promotoras da Iniciativa Legislativa de Cidadãos "Pela Protecção do Cidadão Denunciante", dinamizada pela plataforma proTEJO. A Iniciativa pretende alterar o Regime Geral de Protecção de Denunciantes de Infracções" e pode ser subscrita no site da Assembleia da República.

Esta proposta de alteração legislativa surge em resposta à falta de um articulado que proteja globalmente os cidadãos que denunciam infracções, como é o caso dos ambientalistas e das suas organizações que denunciam atentados ao ambiente e, que por isso, têm vindo a ser alvo de litigância retaliatória conhecida como SLAPP (Litigância Estratégica Contra a Participação Pública, na sigla em inglês), sem fundamento, com o único propósito de desmotivar cidadãos e activistas. A lei actual só prevê protecção para pessoas que façam denúncias no contexto da sua actividade profissional.

Um exemplo flagrante da perseguição judicial a activistas foi a acção civil que exigia uma enorme indemnização ao cidadão Arlindo Consolado Marques, membro do proTEJO – Movimento pelo Tejo, pelas suas denúncias de ocorrências de poluição no rio Tejo. A autora da acção acabou por desistir da litigâncias, mas só depois de ter causado graves danos morais e materiais ao visado.

Não é caso único. Frequentemente, em Portugal, os denunciantes são alvo de processos iníquos, opondo poderosas empresas a cidadãos ou organizações mais frágeis. Mais do que o ressarcir uma eventual acusação injusta, estes processos visam apenas punir e silenciar cidadãos que, de boa fé, deram o alerta para injustiças ou abusos. Os processos “SLAPP” já foram ilegalizados em vários países (EUA, Canada, entre outros) e está actualmente em discussão na União Europeia a criação de uma directiva que proíba esta litigância retaliatória. A Frente Cívica tem estado activa na denúncia deste mecanismo de intimidação judicial, tendo organizado em Novembro de 2022 um debate público sobre o assunto.

A Frente Cívica apela a todos os cidadãos que divulguem esta Iniciativa Legislativa de Cidadãos, que necessita de 20 mil subscrições para ser apreciada no Parlamento. A aprovação desta alteração à lei será um instrumento para a protecção de todos os cidadãos que realizam denúncias de boa fé, como contributo para uma sociedade mais justa, mais transparente e mais integra.

Pode assinar a Iniciativa Legislativa de Cidadãos no site da Assembleia da República, no site Petição Pública ou através do QR Code abaixo:



domingo, 8 de janeiro de 2023

Frente Cívica pede ao Governo que anule benefício a ex-secretária de Estado do Turismo

 

"António Costa Silva - Governo lança linha de crédito de 600 ME para empresas",
por 
Agência Lusa sob licença CC BY 3.0.

A Frente Cívica escreveu este domingo ao ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva, pedindo-lhe que anule o despacho assinado no ano passado pela então secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, concedendo benefícios à empresa que hoje a emprega.

Na carta, o presidente da Frente Cívica, Paulo de Morais, e o vice-presidente João Paulo Batalha notam que a contratação de Rita Marques pelo grupo The Fladgate Partnership "é uma violação clara e flagrante do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos", que proíbe ex-governantes de exercerem funções, até três anos depois de saírem do cargo, em empresas nas quais tenham tido "intervenção directa".

"Por omissão do legislador", aponta a Frente Cívica, a violação da lei pela ex-secretária de Estado não implica a nulidade do despacho que declarou a utilidade turística do projecto "Word of Wine" (para o qual Rita Marques vai agora trabalhar), concedendo-lhe isenções de taxas e benefícios fiscais. Por isso, a associação apela a que o ministro anule o despacho. 

"Permitir que esta situação se mantenha é premiar a infractora e autorizar a violação da lei criada para defender a integridade pública em Portugal. Se é certo que não pode ser assacada ao Governo a responsabilidade por uma decisão individual tomada pela Dra. Rita Marques após ter cessado as suas funções públicas, não pode o Ministério da Economia e do Mar permitir que a vantagem concedida ao empreendimento “World of Wine” produza efeitos. Isso significaria que o Estado Português se resignaria face à violação da lei e ao abuso de funções públicas para obter vantagens privadas", aponta a carta.

Reproduz-se abaixo a carta endereçada ao ministro da Economia e do Mar.



Exmo. Sr. Ministro da Economia e do Mar,

Eng. António Costa Silva

 

Assunto: Violação da lei 52/2019 pela ex-secretária de Estado do Turismo

Data: 8 de Janeiro de 2023

 

Exmo. Sr. Ministro da Economia e do Mar,

Há perto de um ano, a então secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, assinou o Despacho n.º 2078/2022, de 17 de Fevereiro[1], concedendo ao empreendimento turístico “World of Wine” o estatuto de utilidade turística, com um conjunto de vantagens e benefícios associados. Entretanto, na passada sexta-feira, dia 6, foi publicamente anunciada a contratação da mesma Rita Marques, entretanto destituída das suas funções no Governo, para administradora do grupo The Fladgate Partnership, promotor do empreendimento turístico “World of Wine”.

Tal contratação é uma violação clara e flagrante do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos (Lei 52/2019, Artigo 10.º, n.º 1), que especificamente estabelece que “Os titulares de cargos políticos de natureza executiva não podem exercer, pelo período de três anos contado a partir da data da cessação do respetivo mandato, funções em empresas privadas que prossigam atividades no setor por eles diretamente tutelado e que, no período daquele mandato, tenham sido objeto de operações de privatização, tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos e benefícios fiscais de natureza contratual, ou relativamente às quais se tenha verificado uma intervenção direta do titular de cargo político.” (sublinhado nosso).

Infelizmente, por omissão do legislador, embora a lei estatua a nulidade dos actos políticos ou administrativos que configurem benefícios para as empresas de origem dos responsáveis políticos, ou para empresas às quais mantenham ligações durante o exercício do cargo, não ficou salvaguardada a nulidade de actos que beneficiem empresas onde os responsáveis políticos venham a ingressar depois de cessarem funções. No caso concreto, esta omissão legislativa implica que a ex-secretária de Estado possa impunemente ter beneficiado a empresa que agora a emprega, instrumentalizando o Ministério da Economia e do Mar para seu benefício particular.

Permitir que esta situação se mantenha é premiar a infractora e autorizar a violação da lei criada para defender a integridade pública em Portugal. Se é certo que não pode ser assacada ao Governo a responsabilidade por uma decisão individual tomada pela Dra. Rita Marques após ter cessado as suas funções públicas, não pode o Ministério da Economia e do Mar permitir que a vantagem concedida ao empreendimento “World of Wine” produza efeitos. Isso significaria que o Estado Português se resignaria face à violação da lei e ao abuso de funções públicas para obter vantagens privadas.

Pelo exposto, vem a Frente Cívica rogar a V. Exa. que tome a iniciativa de anular o Despacho n.º 2078/2022, de 17 de Fevereiro, desta forma repondo a legalidade e protegendo o Ministério da Economia e do Mar, e todo o Governo, dos custos reputacionais da infeliz violação da lei praticada pela ex-secretária de Estado do Turismo.

Somos, com os nossos cumprimentos

Pela Frente Cívica,

  

 

Paulo de Morais, Presidente

 

 

 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente

 


quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Frente Cívica desafia António Costa a criar conselho de ética na vida pública

 


A Frente Cívica escreveu esta quarta-feira ao primeiro-ministro, António Costa, propondo a criação de um conselho independente de ética na vida pública, capaz de fazer o escrutínio da integridade política dos membros do Governo e altos dirigentes da Administração Pública. A associação disponibilizou-se para mobilizar personalidades e organizações da sociedade civil para dinamizar este organismo, que teria poderes de aconselhamento ao Governo.

A proposta surge na sequência da remodelação governamental provocada pelas demissões do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, e da secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, provocados por mais um caso na TAP. Na carta, a associação recorda que há poucos meses, um outro caso envolvendo o secretário de Estado Miguel Alves tinha afectado a imagem do Governo. 

"Ambos os casos mostram a completa incapacidade de o Governo escrutinar eventuais problemas de integridade e idoneidade dos responsáveis políticos, antes de entrarem nos cargos. Mesmo antes destes escândalos, já a imagem do Executivo estava ensombrada por suspeições de conflitos de interesses – reais, potenciais ou aparentes – que afectaram ministros como Ana Abrunhosa, o próprio Pedro Nuno Santos e outros", lê-se na missiva. "Estes sucessivos escândalos afectam a credibilidade da democracia e comprometem a confiança dos cidadãos nas Instituições. Entendemos que há que pôr cobro, urgentemente, a este tipo de situações".

Por essa razão, e notando que o escrutínio hoje feito à conduta dos responsáveis políticos já é exercido pela comunicação social e pela sociedade civil, a Frente Cívica disponibiliza-se para ajudar a instalar um organismo que faça, entre outras funções, o trabalho que competiria à adiada Entidade da Transparência. "A Entidade da Transparência nunca funcionou, até hoje, por falta de vontade da classe política que a legislou e do Tribunal Constitucional que a deveria instalar. Ao evitar o funcionamento do organismo, o Estado evidencia que não quer, de facto, este controlo".

O conselho de ética na vida pública proposto pela Frente Cívica seguiria um modelo semelhante ao da Comissão de Padrões na Vida Pública existente no Reino Unido, composto por figuras independentes e com poderes de avaliação da conduta ética dos políticos, antes, durante e depois do exercício dos cargos políticos. "Este Conselho colmataria as omissões das instituições já existentes para, de forma sistemática, vincular os que desempenham funções públicas a padrões éticos exigentes e materializar a prometida, mas não cumprida, transparência do património e rendimentos dos políticos, de forma a assegurar a total independência das decisões dos servidores públicos".

Transcreve-se abaixo a carta enviada ao primeiro-ministro.


Exmo. Sr. Primeiro-Ministro,

Dr. António Costa

 

 

 

Assunto: Criação de conselho independente de ética na vida pública

Data: 4 de Janeiro de 2023

 

Exmo. Sr. Primeiro-Ministro,

A demissão do ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, na sequência do escândalo provocado pela indemnização milionária paga pela TAP a Alexandra Reis, não foi, infelizmente para os portugueses, um caso isolado. Alexandra Reis teve, ela própria, de abandonar a sua função de secretária de Estado do Tesouro, escassas três semanas depois de ter tomado posse do cargo.

Pouco tempo antes, já o braço direito de V. Exa., o secretário de Estado Adjunto Miguel Alves, fora obrigado a demitir-se, também escassos meses depois de empossado, na sequência do pagamento antecipado dum estranho “centro de exposições transfronteiriço” em Caminha que nunca se concretizará, mas que já está parcialmente pago.

Ambos os casos mostram a completa incapacidade de o Governo escrutinar eventuais problemas de integridade e idoneidade dos responsáveis políticos, antes de entrarem nos cargos. Mesmo antes destes escândalos, já a imagem do Executivo estava ensombrada por suspeições de conflitos de interesses – reais, potenciais ou aparentes – que afectaram ministros como Ana Abrunhosa, o próprio Pedro Nuno Santos e outros.

Estes sucessivos escândalos afectam a credibilidade da democracia e comprometem a confiança dos cidadãos nas Instituições. Entendemos que há que pôr cobro, urgentemente, a este tipo de situações.

Há que aumentar o nível de exigência no recrutamento de governantes e gestores públicos. É necessário aumentar os padrões éticos nos nomeados e impor a quem os nomeia, em particular ao Primeiro-Ministro, maior exigência ética, maior escrutínio e um crivo mais apertado na escolha dos responsáveis pela “coisa pública” em Portugal.

Os casos atrás referidos apenas têm sido detectados porque tem havido por parte da comunicação social e da sociedade civil uma atitude vigilante. Só esta vigilância tem permitido denunciar estes sucessivos escândalos e fazer uma análise independente das suas perversas consequências. Contrariamente ao que sucede noutros países europeus, não existe qualquer escrutínio sobre as referências éticas de políticos e gestores públicos, nem tão-pouco um controlo eficaz sobre os seus rendimentos, ou avaliação de funções anteriores, nomeadamente que tenham implicado decisões com elevada relevância patrimonial.

Este controlo não existe, apesar de ter sido legislada em 2019 uma “Entidade da Transparência”, a quem competiria a missão de, em nome do povo português, controlar os rendimentos e património dos políticos e as suas alterações ao longo dos anos. A Entidade da Transparência nunca funcionou, até hoje, por falta de vontade da classe política que a legislou e do Tribunal Constitucional que a deveria instalar. Ao evitar o funcionamento do organismo, o Estado evidencia que não quer, de facto, este controlo. E mesmo que a Entidade da Transparência venha a sair do papel, continuará a haver sérios problemas de coordenação e cruzamento de dados entre os diversos organismos com poderes na fiscalização da integridade pública em Portugal.

Para colmatar estas várias falhas institucionais, para romper com esta persistente falta de vontade política, para, em suma, garantir que estes escândalos cessem de vez, e sobretudo cessem as causas que os provocam, impõe-se agora uma intervenção da sociedade civil, que assuma a defesa da ética pública que as instituições políticas têm enjeitado. Só assim se evitarão novos escândalos.

Vimos, portanto, propor que o Governo crie um Conselho independente de Ética na Vida Pública, liderado pela sociedade civil, que reúna e organize a informação sobre o património, rendimentos, conflitos de interesses e referências éticas dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, que actualmente se encontra dispersa por diferentes entidades de controlo (ou é absolutamente omissa).

Esta entidade, composta por elementos da sociedade civil, independentes e não remunerados, aconselharia o Governo sobre a conduta, integridade e idoneidade dos agentes públicos, antes, durante e depois do desempenho de funções, à semelhança do que é feito pela Comissão de Padrões na Vida Pública britânica (Committee on Standards in Public Life[1]) composta maioritariamente por membros independentes seleccionados por concurso público. A criação de tal organismo de aconselhamento do Governo depende apenas da vontade do Primeiro-Ministro, dispensando demorados processos legislativos.

A Frente Cívica prontifica-se a, em conjunto com outras forças da sociedade civil, ajudar a constituir um Conselho verdadeiramente independente, integrado por entidades e personalidades acima de qualquer suspeita. Este Conselho colmataria as omissões das instituições já existentes para, de forma sistemática, vincular os que desempenham funções públicas a padrões éticos exigentes e materializar a prometida, mas não cumprida, transparência do património e rendimentos dos políticos, de forma a assegurar a total independência das decisões dos servidores públicos. Pensamos que poderá ser este o nosso contributo para aumentar a qualidade ética da governação, assim V. Exa. o queira aceitar.

Com os nossos melhores cumprimentos,

 

Pela Frente Cívica,

 

 

  

 

Paulo de Morais, Presidente

 

 


 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente