domingo, 8 de janeiro de 2023

Frente Cívica pede ao Governo que anule benefício a ex-secretária de Estado do Turismo

 

"António Costa Silva - Governo lança linha de crédito de 600 ME para empresas",
por 
Agência Lusa sob licença CC BY 3.0.

A Frente Cívica escreveu este domingo ao ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva, pedindo-lhe que anule o despacho assinado no ano passado pela então secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, concedendo benefícios à empresa que hoje a emprega.

Na carta, o presidente da Frente Cívica, Paulo de Morais, e o vice-presidente João Paulo Batalha notam que a contratação de Rita Marques pelo grupo The Fladgate Partnership "é uma violação clara e flagrante do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos", que proíbe ex-governantes de exercerem funções, até três anos depois de saírem do cargo, em empresas nas quais tenham tido "intervenção directa".

"Por omissão do legislador", aponta a Frente Cívica, a violação da lei pela ex-secretária de Estado não implica a nulidade do despacho que declarou a utilidade turística do projecto "Word of Wine" (para o qual Rita Marques vai agora trabalhar), concedendo-lhe isenções de taxas e benefícios fiscais. Por isso, a associação apela a que o ministro anule o despacho. 

"Permitir que esta situação se mantenha é premiar a infractora e autorizar a violação da lei criada para defender a integridade pública em Portugal. Se é certo que não pode ser assacada ao Governo a responsabilidade por uma decisão individual tomada pela Dra. Rita Marques após ter cessado as suas funções públicas, não pode o Ministério da Economia e do Mar permitir que a vantagem concedida ao empreendimento “World of Wine” produza efeitos. Isso significaria que o Estado Português se resignaria face à violação da lei e ao abuso de funções públicas para obter vantagens privadas", aponta a carta.

Reproduz-se abaixo a carta endereçada ao ministro da Economia e do Mar.



Exmo. Sr. Ministro da Economia e do Mar,

Eng. António Costa Silva

 

Assunto: Violação da lei 52/2019 pela ex-secretária de Estado do Turismo

Data: 8 de Janeiro de 2023

 

Exmo. Sr. Ministro da Economia e do Mar,

Há perto de um ano, a então secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, assinou o Despacho n.º 2078/2022, de 17 de Fevereiro[1], concedendo ao empreendimento turístico “World of Wine” o estatuto de utilidade turística, com um conjunto de vantagens e benefícios associados. Entretanto, na passada sexta-feira, dia 6, foi publicamente anunciada a contratação da mesma Rita Marques, entretanto destituída das suas funções no Governo, para administradora do grupo The Fladgate Partnership, promotor do empreendimento turístico “World of Wine”.

Tal contratação é uma violação clara e flagrante do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos (Lei 52/2019, Artigo 10.º, n.º 1), que especificamente estabelece que “Os titulares de cargos políticos de natureza executiva não podem exercer, pelo período de três anos contado a partir da data da cessação do respetivo mandato, funções em empresas privadas que prossigam atividades no setor por eles diretamente tutelado e que, no período daquele mandato, tenham sido objeto de operações de privatização, tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos e benefícios fiscais de natureza contratual, ou relativamente às quais se tenha verificado uma intervenção direta do titular de cargo político.” (sublinhado nosso).

Infelizmente, por omissão do legislador, embora a lei estatua a nulidade dos actos políticos ou administrativos que configurem benefícios para as empresas de origem dos responsáveis políticos, ou para empresas às quais mantenham ligações durante o exercício do cargo, não ficou salvaguardada a nulidade de actos que beneficiem empresas onde os responsáveis políticos venham a ingressar depois de cessarem funções. No caso concreto, esta omissão legislativa implica que a ex-secretária de Estado possa impunemente ter beneficiado a empresa que agora a emprega, instrumentalizando o Ministério da Economia e do Mar para seu benefício particular.

Permitir que esta situação se mantenha é premiar a infractora e autorizar a violação da lei criada para defender a integridade pública em Portugal. Se é certo que não pode ser assacada ao Governo a responsabilidade por uma decisão individual tomada pela Dra. Rita Marques após ter cessado as suas funções públicas, não pode o Ministério da Economia e do Mar permitir que a vantagem concedida ao empreendimento “World of Wine” produza efeitos. Isso significaria que o Estado Português se resignaria face à violação da lei e ao abuso de funções públicas para obter vantagens privadas.

Pelo exposto, vem a Frente Cívica rogar a V. Exa. que tome a iniciativa de anular o Despacho n.º 2078/2022, de 17 de Fevereiro, desta forma repondo a legalidade e protegendo o Ministério da Economia e do Mar, e todo o Governo, dos custos reputacionais da infeliz violação da lei praticada pela ex-secretária de Estado do Turismo.

Somos, com os nossos cumprimentos

Pela Frente Cívica,

  

 

Paulo de Morais, Presidente

 

 

 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente