Eleições Autárquicas não são Nacionais
As eleições autárquicas não deveriam ocorrer simultaneamente em todo o
país. Não há nenhuma razão para tal. E as desvantagens da simultaneidade são
inúmeras, tanto nas campanhas eleitorais como no rescaldo das eleições.
A primeira e a mais grave de todas tem a ver com as campanhas. Os
líderes dos partidos fazem das campanhas autárquicas momentos de propaganda
partidária. Desprezam os temas locais e apenas falam de questões nacionais. Com
a ajuda das televisões. Nos telejornais, RTP, SIC e TVI noticiaram esta campanha
autárquica como se fosse apenas tempo de antena dos maiores partidos. Deram voz
apenas aos líderes dos partidos de regime (PS, PSD, Bloco, PC e CDS). Ouvimos,
no último mês, Passos Coelho e Jerónimo de Sousa a comentar temas não
autárquicos; vimos Catarina Martins, líder de um partido que tem zero
presidentes de câmara; e ainda levámos com a ilustre desconhecida Ana Catarina
Mendes, do PS - nenhum deles candidato. Ouvimos ainda Assunção Cristas,
candidata em Lisboa, a abordar temas nacionais... no Porto ou em
Trás-os-Montes. Os candidatos independentes foram absolutamente ignorados. Em
tempo de campanha, os líderes dos maiores partidos acharam-se donos das
televisões (sobretudo da RTP), usando os telejornais como tempo de antena,
travestido de noticiário; e assim transformando os jornalistas em
publicitários.
Mas ainda mais grave é a apreciação que se fará dos resultados
eleitorais, quando esta análise for realizada numa perspectiva nacional.
Governo e Oposição irão apropriar-se dos resultados das autárquicas para
fundamentarem a sua análise das políticas nacionais. O que não faz qualquer
sentido. E é ignóbil sob o ponto de vista democrático. Não se pode inferir que
quem vote num candidato autárquico socialista num qualquer concelho concorde
com as políticas governamentais de António Costa. Nem tão-pouco é legítimo
concluir que um votante num autarca do PSD repudie as políticas governamentais
da “Geringonça” ou concorde com o rumo que passos Coelho deu ao PSD. Aliás as
tentativas de análise nacional dos resultados autárquicos são uma forma
ilegítima de coacção sobre o eleitorado; mais coação a somar à propaganda
partidária em tempo de campanha.
É pois urgente que se altere o regime eleitoral para que as eleições
autárquicas não tenham lugar em todos os concelhos ao mesmo tempo. Mas, até lá,
é imperioso que cada um de nós vote em consciência naquele que prefere para
líder autárquico do seu concelho. E não permita que o seu voto seja alienado em
interpretações nacionais abusivas de um voto que é - e se quer continue a ser -
apenas e tão só local e livre; e livre de outras interpretações.
Paulo Morais