quinta-feira, 24 de maio de 2018

Janela da Frente - "O Mundo em NÓS - Europa" - Jorge Amaro

"O Mundo em NÓS - Europa"


A sociedade de hoje, um barco à deriva, náufraga de valores referenciais, abandonado ao leme e sem timoneiro, braceja em esforço à procura de terra firme, sob o estigma de um passado destruidor e na incerteza de um amanhã promissor.

Desde a 2ª Guerra Mundial do pânico e da devastação, à “Guerra Fria” das ideologias de pólos opostos, o mundo de hoje, afunda-se na loucura dos homens (Trump; Putin e outros…), pela permanente ameaça de uma guerra nuclear (Coreia do Norte e do Sul, China e outros…), pelo regresso à disputa de territórios (Israel e Palestina) ou ainda pelo “império do medo”, o terrorismo internacional, (Daesh; ISIS), como se o mundo pudesse subsistir a este concurso de “vaidades” que conduzirá a Humanidade à sua indubitável e progressiva destruição.

Vivemos hoje, sob a permanente ameaça de uma nova guerra mundial, alicerçada na ausência de valores referenciais, no crescimento dos partidos anti-sistema, no definhar da Democracia e na sublimação de uma nova “era de extremos”, temáticas que alguns levianamente insistem em rotular de “avanços civilizacionais”.

A este “ecléctico modernismo” que tempera as sociedades de hoje, mas que nada aprenderam com o passado,  eu designo-o por crises de identidade, um recuo civilizacional, a insegurança que resulta da quebra dessa relação de natural cumplicidade entre a Democracia e a “paz”, porque, tal como bem refere Frei Fernando Ventura: “enquanto forem os fabricantes de armas a negociar a “paz”, o resultado será sempre a guerra”, além de que, “as soluções para a paz não estão nas mãos dos estados, mas nas mãos das pessoas que sonham e desesperam

O desespero dos homens, encontra eco na ausência de pragmatismo e de valores ideológicos, na incapacidade revelada pelas elites políticas em solucionar os grandes desafios que preocupam a Moderna Europa, desde logo, a identidade dos povos e o multiculturalismo, a religião pela tolerância e diversidade confessional, a crise das democracias e os problemas de integração cultural das sociedades que, expostas a radicalismos, à capitalização ideológica ou populismos emergentes, nos transmitem a incerteza quanto à permanecia de uma Paz duradoura, a “ausentia belli”, essa sim, verdadeiramente tranquilizadora da humanidade.

A Europa de hoje e os perigos que a ameaçam, exigem uma reflexão profunda e actualizada à “Declaração de Schumann”, às fragilidades Europeias endógenas e exógenas, ao “esforço criador” ou redutor, das elites políticas que nos governam.

Não admitir as fragilidades da Europa de hoje, é percorrer o mesmo caminho das actuais lideranças políticas, é ignorar as acentuadas desigualdades sociais, o crescendo dos nacionalismos e movimentos anti-sistema, a insegurança potenciada pelo terrorismo, as barreiras culturais e sociais ao emprego, as diversidades civilizacionais e confessionais, todas elas em resultado de espaços abertos e multiculturais, em suma, estamos prestes a negar ao Continente Europeu esse património histórico que lhe confere o estatuto de zona geográfica mais pacífica do mundo.

Colocar em causa a “paz” na Europa, é inverter esse legítimo sonho de uma das economias mais promissoras e simultaneamente mais criativas, é ignorar a desigualdade entre classes sociais, é assumir as vulnerabilidades que conduzem à capitalização ideológica de extremos, é abrir caminho à radicalização e aos populismos, lugares comuns onde habitualmente se refugiam cidadãos desalentados, simultaneamente incrédulos e inseguros, face à inércia das elites políticas e ao “status quo” que as mesmas representam. 

Mais importante que celebrar, a 9 de maio, a Europa, é urgente refletir a Europa.

A Europa que construímos é uma “Europa de Tratados e não um Estado”, o que explica decisões de valor contraditório, caso do "Brexit" no Reino Unido ou o "Grexit" na Grécia, a possível formação de governos com partidos anti-sistema, caso da Liga em Itália, ou da direita xenófoba e cunho nacionalista, hostis à União Europeia, mas também de sensibilidades díspares quanto às questões de soberania, principal divisa dos eurocéticos, sem esquecer as reais fragilidades inerentes às questões de segurança desta Moderna Europa, uma entidade  que se revela incapaz de garantir, de modo uniforme, a segurança dos cidadãos em espaço único europeu.

Tal como George Friedman recentemente proferiu nas “Conferências de Lisboa”, esta Europa que emergiu da “ideia de um sistema político no qual a democracia liberal controla as nações, mas no qual as nações são controladas por uma entidade… não existe, por não corresponder à realidade”, ao que acrescento… é a ficção que nos governa.

"O Mundo em Nós - Europa", não é mais que uma voz que se levanta, um grito de desespero e revolta em nome de uma cidadania europeia activa, a contestação ao permanente encobrimento e passividade políticas das actuais elites desta “Nossa" Europa, ou seja, a fundamentada imagem de uma Europa náufraga que, lentamente se afunda num mar de incertezas.

Jorge Amaro
24/05/2018