"Olhos postos no rectângulo de jogo"
A participação
portuguesa no Campeonato do Mundo de Futebol, na Rússia, é algo que transcende
as clubites partidárias, as clubites desportivas ou até mesmo algumas divergências
de opinião sobre as prioridades definidas pelos cidadãos em matéria de participação
cívica, um juízo de valor que recorrentemente dá prioridade ao futebol em
detrimento da luta e defesa dos valores da cidadania.
Hoje é
dia de exaltar os verdadeiros símbolos nacionais.
Minutos
antes do jogo se iniciar, bem antes de termos os olhos postos no rectângulo de
jogo, para apupar os adversários e aplaudir os nossos dignos representantes, a
selecção de todos nós, iremos sentir um orgulho acrescido em ser português, agitaremos
a Bandeira Nacional, símbolo da soberania da República, da independência, da
unidade e integridade de Portugal e entoaremos em uníssono o Hino Nacional, a
Portuguesa, porque todos somos Portugueses.
Estes
símbolos de unidade nacional, bandeira e hino, adoptados pela República
instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910, são simultaneamente bens
jurídicos considerados dignos de tutela penal, raramente aplicada aos que ultrajam
a República pelo indecoroso exercício de funções públicas, designadamente pela
justiça aplicada e nem sempre executada, tudo isto, porque vivemos num Estado
de Direito em que o direito não se representa na justiça e a justiça não se
assume como forma legal de fazer cumprir o direito.
Quem
achar este paralelismo um exagero, encontrará certamente os mais diferentes
exemplos em figuras públicas inapelavelmente condenadas por tribunais
superiores, face aos gravíssimos danos financeiros causados ao Estado e que, apesar
disso, continuam em pleno gozo da sua liberdade, num Estado de direito que se diz
democrático.
Volto
ao jogo de hoje, para vos falar do nosso adversário, a Espanha.
Em
Espanha, sem paralelo com o que se passa em Portugal, os prevaricadores são
condenados e presos, os governos caem e são substituídos, porque a justiça
espanhola não tem condescendência para com os políticos corruptos, como no caso
do antigo tesoureiro do partido espanhol PP, Luis Bárcenas, que foi condenado a
33 anos e quatro meses de prisão e uma multa que ultrapassa os 44 milhões de
euros, no âmbito do chamado caso Gürtel, ou ainda, do empresário Francisco
Correa, o cabecilha da rede de corrupção, condenado a 51 anos de prisão, sem
esquecer as 37 pessoas, na sua maioria líderes políticos locais e regionais do
Partido Popular, envolvidos num esquema
de corrupção e financiamento ilegal que conduziram o próprio partido a uma
condenação pela Audiência Nacional espanhola, como pessoa jurídica, num
montante global a pagar de mais de 245 mil euros.
A
bem da Democracia e do Estado de Direito, no que respeita à aplicação da
justiça sobre a corrupção e seus actores, o nosso adversário de hoje, a Espanha,
já nos deu uma “abada”, mesmo antes do jogo se iniciar.
Mas,
porque ainda acredito na velha máxima de que os prognósticos futebolísticos só
são assertivos no final do jogo, e porque Portugal tem argumentos para levar de
vencida a seleção espanhola, coloquemos os olhos no retângulo de jogo e
apoiemos a nossa seleção rumo a esta vitória ibérica, que logo na 1ª fase do
Mundial colocou frente a frente, Portugal e Espanha, países vizinhos, em que as
principais fronteiras são as enormes barreiras civilizacionais, políticas, culturais,
económicas, sociais, mas também as judiciais.
Como bom
português, acredito que levaremos de vencida todos os adversários, superaremos
todos os obstáculos e com enorme mérito seremos os próximos Campeões Mundiais de
Futebol, na Rússia, para com idêntico fervor lutarmos pelos valores da
cidadania, exigir a aplicação da justiça em defesa dos valores da República,
sermos uma verdadeira Democracia que se regenere em cada um de nós pelo orgulho
nacional, onde todos sintam regozijo ao exaltar os símbolos nacionais.
Sou português,
com os olhos postos neste rectângulo que é Portugal…
Jorge Amaro
15/06/2018