O despacho do primeiro-ministro, escreve a Frente Cívica, "suscitou intensa discussão pública sobre eventuais riscos de práticas especulativas nos preços da energia em Portugal; e sobre se a reacção do Governo, corporizada no dito Despacho, configura uma resposta apropriada em defesa do interesse público, ou antes uma represália indevida contra uma empresa privada por “delito de opinião”.
Para que o escrutínio das acções do Governo possa ser feito de modo informado pelos cidadãos, a associação faz oito perguntas ao primeiro-ministro, sobre as suspeitas concretas que tem de riscos especulativos, sobre se essas suspeitas foram comunicadas às autoridades e sobre o volume de facturas que se prevê tenham de ser pessoalmente validadas pelo secretário de Estado, bem como sobre a eficácia previsível de tal sistema de controlo.
"As famílias e as empresas portuguesas têm sofrido com o aumento dos preços da energia, fruto de uma conjuntura internacional adversa e de evolução difícil de antecipar. Essa incerteza e volatilidade não devem ser agravadas, nem por declarações infundamentadas de responsáveis do sector, nem por medidas governamentais cuja extensão, alcance e impacto não sejam claras e comunicadas em pleno aos portugueses", escreve a Frente Cívica.
"A crise energética é um problema sério e não pode ser tratado com iniciativas levianas para mero teatro mediático, nem da parte dos operadores económicos, nem da parte do Governo. Se há suspeitas fundadas de especulação, o Estado deve defender-se - e defender os consumidores. Temos de perceber se um mecanismo de validação de, potencialmente, centenas ou milhares de facturas todos os meses é a forma útil de garantir essa protecção", explica o vice-presidente da Frente Cívica, João Paulo Batalha.
Anexa-se, para conhecimento, a carta enviada ao primeiro-ministro.
Exmo. Sr. Primeiro-Ministro,
Dr. António Costa
Assunto: Ameaças de práticas
especulativas pela ENDESA
Data: 5 de Agosto de
2022
Exmo. Sr. Primeiro-Ministro,
O Despacho nº. 68/2022, emitido por V. Exa. no
último dia 1 de Agosto, suscitou intensa discussão pública sobre eventuais
riscos de práticas especulativas nos preços da energia em Portugal; e sobre se
a reacção do Governo, corporizada no dito Despacho, configura uma resposta
apropriada em defesa do interesse público, ou antes uma represália indevida contra
uma empresa privada por “delito de opinião”. São questões relevantes, que
merecem um debate esclarecido.
Por essa razão, e para que possa ser eficazmente
medido o alcance e impacto das medidas determinadas pelo Despacho n. 68/2022 de
V. Exa., vem a associação Frente Cívica por este meio requerer a V. Exa. que
nos esclareça – e, por esta via, publicamente esclareça o país – do seguinte:
1-
Quais são, concreta e especificamente, as “ameaças”
identificadas pelo Governo, de “práticas especulativas de preços a praticar
pela ENDESA”, referenciadas, mas não concretizadas, no Despacho nº 68/2022?
2-
Tendo o Governo suspeitas de práticas especulativas
ilegais, em que data e de que forma foram essas suspeitas comunicadas pelo
Governo ao Ministério Público e/ou aos reguladores competentes (nomeadamente a
Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos), para investigação e eventual
responsabilização dos envolvidos, mesmo que de carácter preventivo?
3-
Qual o número total de entidades da administração directa
e indirecta do Estado com contratos celebrados com a ENDESA, cujas facturas
estarão agora sujeitas a “validação prévia” do Exmo. Sr. Secretário de Estado
do Ambiente e da Energia?
4-
Qual é o número esperado de facturas que, todos os
meses e desde 2 de Agosto (data a partir da qual produz efeitos o referido Despacho)
terão de ser remetidas ao Exmo. Sr. Secretário de Estado para “validação
prévia”?
5-
Serão remetidas, por cada entidade obrigada, apenas as
facturas de cada mês, ou pedirá o Exmo. Sr. Secretário de Estado que sejam
também remetidas facturas de meses anteriores (e, se sim, em que número?), para
verificação de eventuais acréscimos especulativos face os valores habitualmente
cobrados pelo fornecedor?
6-
De que dados ou instrumentos dispõe o Governo para concluir
que o Exmo. Sr. Secretário de Estado do Ambiente e da Energia está em melhor
posição de identificar eventuais práticas especulativas do que os próprios
serviços da administração directa e indirecta do Estado, no âmbito dos seus
controlos internos de tesouraria e gestão corrente?
7-
Tem o gabinete do Exmo. Sr. Secretário de Estado do
Ambiente e Energia os recursos necessários para fazer a “verificação prévia” de
todas as facturas a conferir, em prazo útil que previna os serviços da
administração directa e indirecta do Estado de entrarem em situações de
eventual incumprimento contratual, danosas para o interesse público e a boa
gestão do dinheiro dos contribuintes?
8-
Não estipulando o Despacho de V. Exa. um prazo de
vigência deste regime de “verificação prévia” de facturas, até quanto prevê o
Governo que o mesmo vigore, e que factos objectivos poderão tranquilizar o
Governo de que as ditas “ameaças de práticas especulativas nos preços a
praticar pela ENDESA” estarão afastadas, permitindo a revogação do Despacho?
Exmo. Sr. Primeiro-Ministro,
As famílias e as empresas portuguesas têm sofrido
com o aumento dos preços da energia, fruto de uma conjuntura internacional
adversa e de evolução difícil de antecipar. Essa incerteza e volatilidade não
devem ser agravadas, nem por declarações infundamentadas de responsáveis do
sector, nem por medidas governamentais cuja extensão, alcance e impacto não
sejam claras e comunicadas em pleno aos portugueses. Nesse espírito, aguardamos
com interesse a resposta às nossas questões.
Somos, com os nossos cumprimentos,
Pela FRENTE CÍVICA,
Paulo de Morais, Presidente
João Paulo Batalha, Vice-Presidente