Você Está Livre da Prisão
De acordo com o Índice de Percepção da Corrupção
da Transparency International, Portugal é um dos países mais corruptos da
Europa, a par da Grécia, Itália e Espanha. Neste infeliz grupo - países em que
a corrupção domina a vida pública e a política - Portugal é aquele em que os
corruptos têm gozado de maior impunidade. Raramente são acusados, quase nunca
julgados e. mesmo se condenados, jamais são presos.
Como em Espanha, há também no nosso país inúmeros
crimes urbanísticos, os escândalos sucedem-se: Parque Mayer em Lisboa, Vale do
Galante na Figueira, edifício Cidade do Porto, Vale de Lobo no Algarve. E
condenações por cá? Nenhumas… Enquanto isso, em Espanha, num único processo, o
Malaya (assim designado porque envolve corrupção urbanística entre Málaga e
Ayamonte), foram presos bem mais de cem autarcas. Até a cantora e figura do
jet-set Isabel Pantoja foi condenada e presa. Em tempos, o chefe do governo, Mariano
Rajoy, teve mesmo de pedir desculpas públicas pela corrupção que contaminou o seu
partido, no poder. Até na Grécia, foi provada corrupção na aquisição de
submarinos alemães, num processo similar ao português. Os alemães envolvidos
foram sentenciados com duras penas, o ex-ministro grego da Defesa foi preso. Mas
em terras lusas, apesar de os tribunais germânicos terem evidenciado a
corrupção e haver detenções na Alemanha… zero presos em Portugal.
Esta situação de total impunidade não é obra do
acaso. Por um lado, é obra da inoperância dos Tribunais. Apesar de nos últimos
anos o Ministério Público ter proferido algumas acusações a políticos de todos
os quadrantes – não há ainda resultados visíveis. Por outro lado, resulta de
uma legislação confusa. E, finalmente, duma corrupção generalizada na Política
e no topo da Administração Central.
Apesar de tudo, nos últimos tempos, alguns
políticos famosos e influentes foram apanhados pela Justiça: José Sócrates,
Ricardo Salgado, Miguel Macedo, Armando Vara, Duarte Lima, Oliveira e Costa.
Mas os processos são lentos e exasperantes, o povo desespera na ânsia de
Justiça. Ricardo Salgado ainda não foi acusado, José Sócrates ainda não foi
julgado, o julgamento de Miguel Macedo no caso dos vistos Gold eterniza-se…
E, mesmo quando os julgamentos se concluem, mesmo
quando há condenações a prisão efetiva… ninguém é preso. Como sucede com Armando
Vara, que foi condenado a cinco anos de prisão efectiva, mas não foi detido,
volvidos quatro anos sobre a condenação; ou com Oliveira e Costa, condenado no
caso BPN, que também continua em liberdade. Assim como Duarte Lima….
Há justificações formais para que tal suceda: como
o regime penal admite recursos atrás de recursos - e estes suspendem a execução
das penas – os recursos e pedidos de aclaração de sentenças servem de manobras
dilatórias para impedir que a Justiça seja efectivamente realizada. Mas a razão
real é outra: os políticos mais poderosos são cúmplices dos maiores criminosos
de colarinho branco e garantem, por todas as formas, que estes se tornem
intocáveis. Bastará contratar as sociedades de advogados que melhor consigam
urdir, nos interstícios da legislação, a teia da impunidade. Os subornos pagam sempre
toda a proteção.
E assim será, até ver. Até que a Justiça se
liberte definitivamente desta teia, os maiores corruptos dispõem do cartão
“você está livre da prisão”; neste jogo de Monopólio, que garante que o
verdadeiro poder já não pertence ao povo, mas aos grandes grupos económicos que
capturaram a nossa democracia.
Paulo de Morais
Março 2018