quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Janela da Frente - CONTRATOS FORA DE ESTABELECIMENTO - Mário Frota





CONTRATOS FORA DE ESTABELECIMENTO

·         O que são?
·         Quais os que se lhes equiparam?
·         Que espécies de contratos fogem ao seu regime?
·         Como se celebram tais contratos?
·         Que direitos se conferem aos consumidores?
·         E se do contrato não constar o direito de “dar o dito por não dito” ou se não for entregue ao consumidor o “formulário de desistência” que o deve acompanhar?

O que são?

Contratos fora do estabelecimento comercial são os que ocorrem na presença física simultânea do fornecedor e do consumidor em local que não seja o estabelecimento daquele: neles se incluem ainda os que decorrem de uma proposta formulada pelo próprio consumidor.
Quais os que se lhe equiparam?
Os celebrados
·         no estabelecimento comercial do fornecedor ou através de quaisquer meios de comunicação à distância imediatamente após o consumidor ter sido, pessoal e individualmente, contactado em local que não seja o do estabelecimento (contactos de rua);
·         no domicílio do consumidor (porta-a-porta);
·         no local de trabalho do consumidor (contratos de ocasião);
·         em reuniões em que a oferta seja promovida por demonstração perante um grupo de pessoas reunidas no domicílio de uma delas, a pedido do fornecedor (ou seu representante) (reuniões “tupper-ware”);
·         durante uma deslocação organizada pelo fornecedor (ou seu representante) fora do respectivo estabelecimento comercial (contratos “tipo” “conheça a… Galiza grátis”);
·         no local indicado pelo fornecedor, a que o consumidor se desloque, por sua conta e risco, na sequência de uma comunicação comercial feita por aquele (ou seu representante).

Quais os contratos que “fogem” a este regime?

Os
·         de serviços financeiros (aqui há um regime especial, previsto noutro diploma legal);
·         através de máquinas distribuidoras automáticas ou de estabelecimentos comerciais automatizados;
·         com operadores de telecomunicações (em cabines telefónicas públicas ou à utilização de uma única ligação telefónica, de Internet ou de telecópia efectuada pelo consumidor);
·         de construção, reconversão substancial, compra e venda ou a outros direitos relativos a imóveis, incluindo os contratos de arrendamento;
·         de serviços sociais, nomeadamente no sector da habitação, da assistência à infância e serviços dispensados às famílias e às pessoas com necessidades especiais permanentes ou temporárias, incluindo os cuidados continuados;
·         de cuidados de saúde, prestados ou não no âmbito de uma estrutura de saúde e independentemente do seu modo de organização e financiamento e do seu carácter público ou privado;
·         de jogos de fortuna ou azar, incluindo lotarias, bingos e actividades de jogo em casinos e apostas;
·         de viagens turísticas (pacotes turísticos);
·         de habitação periódica ou turística, cartões turísticos e de férias e afins;
·         de géneros alimentícios, bebidas ou outros bens destinados ao consumo corrente do agregado familiar, entregues fisicamente pelo fornecedor em deslocações frequentes e regulares ao domicílio, residência ou local de trabalho do consumidor;
·         em que intervenha titular de cargo público obrigado por lei à autonomia e imparcialidade (notário, conservador…);
·         de transporte de passageiros e
·         de aquisição de assinaturas de publicações periódicas, cujo preço não exceda 40 €.
Como se celebram tais contratos?
São reduzidos a escrito. Se o não forem, são nulos e de nenhum efeito.
E devem conter, de forma clara e compreensível e em língua portuguesa, as informações constantes de uma outra norma do diploma legal de que se trata. Sob pena também de nulidade.
O fornecedor deve entregar ao consumidor uma cópia do contrato assinado ou a confirmação do contrato em papel ou, se o consumidor concordar, noutro suporte duradouro, incluindo, se for caso disso, a confirmação do consentimento prévio e expresso do consumidor e o seu reconhecimento.
Convém significar que por “suporte duradouro” se entende qualquer instrumento, designadamente o papel, a chave Universal Serial Bus (USB), o Compact Disc Read-Only Memory (CD-ROM), o Digital Versatile Disc (DVD), os cartões de memória ou o disco rígido do computador, que permita ao consumidor ou ao fornecedor armazenar informações que lhe sejam pessoalmente dirigidas, e, mais tarde, aceder-lhes pelo tempo adequado à finalidade das informações, e que possibilite a respectiva reprodução inalterada.

Que direitos se reconhecem nestes contratos aos consumidores?


O consumidor tem o direito de desistir do contrato sem incorrer, em princípio, sem quaisquer custos e sem necessidade de indicar o motivo, no prazo de 14 dias, a contar:

·         Do dia da celebração do contrato, no caso dos contratos de prestação de serviços;
·         Do dia em que o consumidor ou um terceiro, com excepção do transportador, indicado pelo consumidor adquira a posse física dos bens, no caso dos contratos de compra e venda.
·        

 Tal direito é, pois,

·         imotivável (não sendo necessário invocar qualquer motivo, causa ou fundamento para o exercer);
·         inindemnizável (não há que indemnizar ou compensar, em princípio, o fornecedor pela “ruptura” do contrato…)
·         irrenunciável (o consumidor não pode a tal  renunciar por se tratar de direito cuja natureza é imperativa, como o impõe o artigo 29 da Lei dos Contratos à Distância e Fora de Estabelecimento).

E se do contrato não constar o direito de “dar o dito por não dito” ou se não for entregue ao consumidor o “formulário de desistência” que o deve acompanhar?

Se o fornecedor não cumprir o dever de informação pré-contratual alusivo ao direito de desistência (que é de 14 dias) nem anexar ao contrato o “formulário de desistência”, o prazo para o efeito passa a ser de 12 meses a contar do termo prazo inicial (dos 14 dias).
12 meses e não 14 dias. 12 meses que acrescem aos 14 dias cuja menção se omitiu.
12 meses para dar o “dito por não dito”. Nem mais, nem menos.

E se, por hipótese, do contrato constar uma cláusula que imponha ao consumidor a renúncia ao “direito de desistência” (o que começa a suceder em determinadas circunstâncias, por estranho que pareça… ou talvez não!), dado que os direitos conferidos ao consumidor e impostos como deveres ao fornecedor são imperativos, prevalece o prazo de 12 meses para o exercício de tal direito (o de retractação, o de se “dar o dito por não dito”).




Mário Frota
CEDC – Centro de Estudos de Direito do Consumo de Coimbra