Já não há notícias
Não
amigos, não há, há repetições de lugares comuns, o mais do mesmo a que nos
habituamos para continuarmos consumidores e clientes, utentes por vezes, em vez
de cidadãos.
Para
mim a notícia – triste, desgraçada – da manhã de ontem, quarta-feira, tinha a
ver com a revelação de que Portugal não fizera progressos na luta contra a
corrupção e descêramos um lugar no ranking. A notícia rainha substituta,
filmada de todos os ângulos e com os esclarecimentos mais pueris levados à
exaustão da vulgaridade, dissecava o acidente com o katamaran que faz a
travessia do Tejo e provocara alguns feridos: o pico informativo aconteceu
quando um canal de TV passou de 10 acidentados para 34 – o top estava
conseguido.
As
bicas pararam nos cafés de boca aberta para as televisões; no trânsito os
noticiários suscitaram alguns toques e mais lentidão em que gosta de ver a
desgraça alheia; na Assembleia da República os comentadores depenicavam-se
porque o PSD ia votar ao lado do BE e da CDU contra a TSU. À noite, as
explicações oriundas da pureza ideológica fizeram-me sorrir, o interesse da
nação é substituído pelo chiste palavroso povoado de lugares-comuns, tão
comuns, tão mais do mesmo. Já não há notícias. O governo governa à vista e a
malta equilibra-se como pode sobre a jangada.
O
país continua corrupto e mesmo assim há quem fale ex-cathedra sobre a
necessidade de investimento externo. Como? Num país corrupto? Num país com uma
política fiscal flutuante de ano para ano? Num país que paga empréstimos a 10
anos acima dos 4% e não vai crescer mais do que um por cento e qualquer coisa
que logo se vê?
Precisamos
de mais acidentes no Tejo para afastar o enfoque nos acidentes que virão
certamente bater-nos à porta, se não deixarmos de navegar à vista.
António
Manuel Ribeiro