domingo, 22 de janeiro de 2017

Janela da Frente - LIVROS auxiliares dos professores, ou professores auxiliares dos LIVROS? - Maria Teresa Serrenho




Os manuais escolares têm sido tema de discussão nos últimos dias. Este é um assunto que há muito preocupa a comunidade de cidadão, pais e encarregados de educação que têm a consciência de que a educação tem que ser uma tarefa de todos, da sociedade em geral.

A Educação a seguir ao 25 de Abril teve uma época de grande entusiasmo e inovação, mas, também de algum desnorte. No entanto a preocupação pelas práticas inovadoras na educação, faziam parte do dia a dia das escolas e dos professores, não obstante os paupérrimos recursos de então. Como é natural a seguir veio a “estabilidade” e começaram a aparecer em catadupa oferta de manuais escolares das mais diversas editoras.

Essa grande oferta, fez despertar a sede de negócio, e, as grandes editoras começaram a absorver as mais pequenas, numa ânsia de controlar o negócio de um mercado bem prometedor.

Por outro lado, os professores, cada vez mais assoberbados com trabalhos burocráticos, foram-se deixando levar por ofertas mais estruturadas que lhe facilitavam a vida.

A profissão de professor deveria ser sempre criativa e pouco rotineira, os alunos e as circunstâncias são diferentes, logo não se podem usar as mesmas estratégias de uma turma para outra, ou de um ano para o outro. Esta possibilidade de colocar criatividade no dia a dia, deveriam ser o maior desafio desta profissão.

Os manuais escolares, deveriam ser auxiliares dos professores e nunca o contrário. Mas, de repente com as ofertas das editoras, não apenas de manuais escolares, mas dos seus “projectos”, os professores vêem-se confrontados com uma nova realidade, com o risco de poderem facilmente passar a ser, eles, os auxiliares dos manuais.

A fantástica função de professor, é pervertida e condicionada ainda pelo apelo gráfico, onde abundam as ilustrações, ricamente coloridas, mas onde a experimentação real é colocada em segundo plano, perdendo-se por isso a significância das aprendizagens experimentadas.

Ainda há pouco tempo, surgiu o debate da situação tradicionalista e desajustada das escolas, face à época de grandes mudanças em que nos encontramos, parecendo inclusivamente existir um retrocesso, voltando-se a um modelo livresco e expositivo de ensinar. Esta seria a oportunidade de repensar a educação, procurando-se formas mais participadas de aprendizagem activa, motivando a procura do conhecimento e estimulando a vontade de aprender.

Mas de repente surgiram os resultados dos ranking das escolas e as nossas apresentaram pequenas tendências de melhoria nos resultados. Imediatamente se esqueceu o debate iniciado, porque afinal estaríamos no bom caminho!

E pronto, alegres e contentes, com uns resultados medidos por testes internacionais de ensino formatado e massificado, onde as várias inteligências hoje conhecidas, não têm lugar, onde não tem cabimento a capacidade de análise critica, o raciocínio ou a construção de saberes. Ficamos conformados e tudo continua na mesma. Carradas de livros caríssimos (que os professores se sentem na obrigação de utilizar até à exaustão, pois os pais gastaram muito dinheiro neles). Livros impingidos às escolas e aos professores. Professores que por comodismo ou inércia, nem sequer questionam a utilização, mesmo quando são confrontados com responsabilidades e benefícios, dos quais só usufruem eventualmente as migalhas, pois o grande “bolo” continuará a ser das editoras instaladas, cujo poder consegue inclusivamente colocar em causa as boas intenções de qualquer reforma do próprio Ministério.

É preciso e urgente repensar a Educação, sem a influência dos interesses e lóbis livreiros e com a consciência de que o Mundo mudou. O Mundo muda em cada dia e as crianças têm que ter uma escola mais desafiante e motivadora de aprendizagens significativas, que terão que as acompanhar ao longo da vida. Aprendizagens que se fazem com os outros, com a natureza, com a experiência e não apenas com manuais escolares.

Como afirmava Aristóteles:

 "Ensinar não é uma função vital, porque não tem o fim em si mesma; a função vital é aprender."