A Liberdade de Expressão como Direito Fundamental:
Venho falar-vos um pouco da Liberdade de Expressão.
A liberdade de expressão e informação
configura um direito fundamental do nosso regime democrático, consagrado no artigo
37º da Constituição da República
Portuguesa e no artigo 10º da Convenção
Europeia dos Direitos do Homem.
O debate entre diversas perspectivas do
Mundo e da vida em sociedade, mesmo que opostas e conflituosas, constitui uma
das características basilares dum Estado de Direito Democrático.
Como bem entendeu, numa das suas
decisões mais emblemáticas, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem “ A liberdade de expressão constitui um dos
fundamentos da sociedade democrática, sendo uma condição fundamental do
progresso e da realização individual; a liberdade de expressão abrange não só a
informação ou ideias que são recebidas favoravelmente, ou consideradas
inofensivas, mas também aquelas que possam ofender, chocar ou incomodar, tal
como decorre do pluralismo e da tolerância, sem as quais não existe uma
sociedade democrática; esta liberdade está sujeita a excepções que – como
decorre da Jurisprudência do Tribunal – devem ser interpretadas restritivamente
e de um modo inteiramente convincente. “
É certo que muitas vezes, seguramente
vezes de mais, agentes políticos e económicos da nossa Pátria revelam uma
excessiva susceptibilidade, aqui e ali nos limites da intolerância, face a
opiniões críticas sobre assuntos de interesse público e do seu envolvimento nos
mesmos, com um injustificado recurso aos Tribunais a coberto duma alegada
defesa do seu bom nome. Tal susceptibilidade suporta, aliás, um aumento
desproporcionado quando o tema em debate é o uso, o abuso e o desperdício de
dinheiros públicos.
Têm-se, no entanto, deparado, nos
últimos anos, com uma Doutrina e Jurisprudência que consubstanciam uma justa e adequada
ponderação entre a liberdade de expressão e crítica como direito fundamental
dum Estado de Direito Democrático e o direito à honra e consideração pessoal.
Bem ilustrativo desse entendimento é a
passagem, que passo a transcrever, do Acórdão do Tribunal da Relação de
Guimarães, de Outubro de 2014, aliás proferido num procedimento determinado
pela queixa dum agente político contra Paulo
Morais: “ Entendemos que o direito de
expressão, na sua vertente de direito de opinião e crítica, quando se exerça e
recaia nas concretas áreas atrás referidas ( quais sejam as obras ou atos de
cada um ) e com o conteúdo e âmbito
mencionados, isto é que se mostrem adequados aos pertinentes dados de facto,
caso redunde em ofensa à honra, se pode e deve ter por atípico, desde que o
agente não incorra na crítica caluniosa ou na formulação de juízos de valor aos
quais subjaz o exclusivo propósito de rebaixar e de humilhar. Costa Andrade
afirma, por seu turno, que: O exercício do direito de crítica tende a provocar
situações de conflito potencial com bens jurídicos como a honra e cuja
relevância está à partida excluída por razões de atipicidade. Tal vale,
designadamente, para os juízos de apreciação e valoração crítica vertidos sobre
realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc., ou sobre
prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espectáculo, e, permito-me
acrescentar, da actividade política. Segundo o entendimento hoje dominante, na
medida em que não se ultrapassa o âmbito da crítica objectiva – isto é, enquanto
a valoração e censura crítica se atêm exclusivamente às obras, realizações ou
prestações em si, não se dirigindo directamente à pessoa dos seus autores ou
criadores – aqueles juízos caem já fora da tipicidade de incriminações como a
difamação. Já porque não atingem a honra pessoal do cientista, artista ou
desportista, etc., já porque não o atingem com a dignidade penal e a carência
de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica. Num
caso e noutro, a atipicidade afasta, sem mais e em definitivo, a
responsabilidade criminal do crítico, não havendo, por isso, lugar à busca da
cobertura de uma qualquer dirimente da ilicitude. “
Em suma, o direito fundamental de
expressão e de crítica é legítimo, mesmo que os juízos sejam desprimorosos,
reconhecendo-se como próprios duma sociedade democrática, desde que dirigidos
às ideias, às obras, à criação humana, e não exclusivamente às pessoas, com
meros intuitos mesquinhos de rebaixamento ou humilhação.
José Puig
José Puig